Apesar de ser assunto atual, e de já estar presente em teses, estudos e na maioria dos livros didáticos, é necessário entender o objetivo de se estudar os gêneros textuais.
Os gêneros textuais ou discursivos[1] são realizações lingüísticas que refletem a função comunicativa ou contexto sócio-interacional no qual estão inseridos. Como afirma Marcuschi[2], “são textos que encontramos em nossa vida diária e que apresentam padrões socio-comunicativos característicos definidos por composições funcionais, objetivos enunciativos e estilos concretamente realizados de forças históricas, sociais, institucionais e técnicas.”
Sabe-se que os gêneros textuais orais e escritos são variados, e que é tarefa complexa sistematizá-los ou classificá-los. Os gêneros discursivos são formados a partir da situação comunicativa, por conseguinte, são mutáveis e diversos, conforme analisa Marcuschi, no artigo “Gêneros Textuais: configuração, dinamicidade e circulação” [3]:
Como já lembrado, os gêneros textuais não se caracterizam como formas estruturais estáticas e definidas de uma vez por todas. Bakhtin [1997] dizia que os gêneros eram tipos “relativamente estáveis” de enunciados elaborados pelas mais diversas esferas da atividade humana. São muito mais famílias de textos com uma série de semelhanças. Eles são eventos linguísticos, mas não se definem por características linguísticas; caracterizam-se, como já dissemos, enquanto atividades sócio-discursivas. Sendo os gêneros fenômenos sócio-históricos e culturalmente sensíveis, não há como fazer uma lista fechada de todos os gêneros.
Os gêneros textuais não podem ser tratados meramente por seus aspectos linguísticos, já que aquilo que os define é exatamente um conceito aproximado de suas características funcionais e sócio-comunicativas.
Quando dominamos um gênero textual, não dominamos uma forma linguística e sim uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares. [4]
Faz-se necessário distinguir antes de analisar de forma mais profunda a intergenericidade, os gêneros textuais das tipologias textuais. Conquanto o gênero textual seja definido por sua funcionalidade, o tipo textual é definido como[5]:
(…) Espécie de seqüência teoricamente definida pela natureza linguística de sua composição {aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais, relações lógicas}. Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração, argumentação, exposição, descrição, injunção.
A classificação de tipos textuais diferencia-se da dos gêneros, em vários aspectos, que vão desde a quantidade de formas existentes, ao tipo de características envolvidas. Entretanto, o que mais diferencia os dois conceitos é a constituição de situações comunicativas, realizadas pelos gêneros e não realizadas pelos tipos textuais enquanto estrutura autônoma desintegrada de um contexto. Marcuschi distingue as principais características entre essas estruturas:
Tipos textuais |
Gêneros Textuais |
1. Constructos teóricos definidos por propriedades linguísticas intrínsecas |
1. Realizações linguísticas concretas por propriedades sócio-comunicativas |
2. Constituem seqüências linguísticas ou seqüências de enunciados no interior dos gêneros e não são textos empíricos |
2. Constituem textos empiricamente realizados cumprindo funções em situações comunicativas |
3. Sua nomeação abrange um conjunto limitado de categorias teóricas determinadas por aspectos lexicais, sintáticos, relações lógicas, tempo verbal; |
3.Sua nomeação abrange um conjunto aberto e praticamente ilimitado de designações concretas determinadas pelo canal, estilo, conteúdo, composição e função. |
4. Designações teóricas dos tipos; narração, argumentação, descrição, injunção e exposição |
4.Exemplos de gêneros; telefonema, sermão, carta pessoal, romance, bilhete, aula expositiva, reunião de condomínio, horóscopo, receita culinária, bula de remédio, lista de compras, cardápio, instruções de uso, outdoor, inquérito policial, resenha, edital de concurso, piada, conversação espontânea, conferência, carta eletrônica, bate-papo virtual, aulas virtuais etc. |
Fonte: DIONÍSIO, Ângela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 5ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2007. Pág . 23
Por se tratar de conceitos apenas recentemente abordados na formação de professores, os tipos textuais são freqüentemente confundidos com os gêneros textuais. Mas é importante expor que as tipologias textuais formam estruturas linguísticas que integram os gêneros, ou seja, estão inter-relacionadas. Um gênero textual, como um relatório, ou uma carta, por exemplo, pode ser formado por diversas tipologias textuais concatenadas:
Os gêneros são uma espécie de armadura comunicativa geral preenchida por seqüências tipológicas de base que podem ser bastante heterogêneas, mas relacionadas entre si. Quando se nomeia um certo texto como “narrativo”, “descritivo” ou “argumentativo”, não se está nomeando o gênero e sim o predomínio de um tipo de seqüência de base.[6]
Mesclam-se, assim, em um determinado gênero, vários tipos textuais e as duas categorias (gênero e tipo) se realizam conjuntamente e não se excluem.
Outra importante distinção é a relação entre tipologia, gênero textual e domínio discursivo. Um domínio discursivo é a prática discursiva que abrange uma série de gêneros e que pode ser espaço de criação de outros gêneros. Segundo Marcuschi[7]:
Usamos a expressão domínio discursivo para designar uma esfera ou instancia de produção discursiva ou de atividade humana. Esses domínios não são textos nem discursos, mas propiciam o surgimento de discursos bastante específicos. Do ponto de vista dos domínios, falamos em discurso jurídico, discurso jornalístico, discurso religioso etc.. já que as atividades jurídica, jornalística ou religiosa não abrangem um gênero em particular, mas dão origem a vários deles. Constituem práticas discursivas dentro das quais podemos identificar um conjunto de gêneros textuais que, ás vezes, lhe são próprios (em certos casos exclusivos) como práticas ou rotinas comunicativas institucionalizadas.[8]
Por fim, é importante relacionar a precípua diferença entre os três conceitos principais, que mesmo distintos, se relacionam a fim de formar uma situação comunicativa. Como afirma Beaugrande[9] (apud Marcuschi, 1997) “Os textos são acontecimentos discursivos para os quais convergem ações linguísticas, sociais e cognitivas.
A definição dada aos termos aqui utilizados é muito mais operacional do que formal. Assim, para a noção de tipo textual predomina a identificação de seqüências linguísticas como norteadoras, já para a noção de gênero textual, predominam os critérios de ação prática, circulação sócio-histórica, funcionalidade, conteúdo temático, estilo e composicionalidade, sendo que os domínios discursivos são as grandes esferas da atividade humana em entidades formais, mais sim entidades comunicativas Gêneros são formas verbais de ação social relativamente estáveis realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios discursivos
específicos.[10]
[1] Será seguida a mesma linha teórica de Marcuschi, portanto, não se discutirá se é mais pertinente a expressão “gênero textual” ou “gênero do discurso”. Será adotada a posição neste trabalho de que todas essas expressões podem ser usadas intercambiavelmente, salvo naqueles momentos em que se pretende, de modo explícito e claro, identificar algum momento específico.
[2] MARCUSCHI, Luis Antônio. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008. Pág 155.
[3]In: DIONÍSIO, Ângela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 5ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2007. Pág . 41
[4] Idem, pág 154.
[5] DIONÍSIO, Ângela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 5ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2007. Pág . 22.
[6] DIONÍSIO, Ângela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 5ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2007. Pág . 27.
[7] Idem, pág. 23.
[8] DIONÍSIO, Ângela P.; MACHADO, Anna R.; BEZERRA, Maria A. (Org.) Gêneros Textuais e Ensino. 5ª ed. Rio de Janeiro:Lucerna, 2007. Pág . 23
[9] Idem, pág 24.
[10] Idem, pág 24-25.
Fonte: Harrison Rocha. Curso de especialização em revisão de texto.
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