Vale de La luna, Ojos de Cejar, laguna Cejar e laguna Tebenquinte

unnamedfdfd(2)

San Pedro do Atacama é uma cidade muito pequena, um povoado na verdade. Lembrou-me bastante de São Jorge, na Chapada dos Veadeiros. A grande diferença é o clima extremamente seco e o calor, muito maior no deserto.

laguna tebenquinche

Uma outra diferença é a arquitetura da cidade. Todos os estabelecimentos e casas em San Pedro são de adobe, há muitas ruas não asfaltadas, é tudo muito simples.

legallsA maioria dos hotéis adota um estilo rústico, algo como fugere urbem. Fiquei hospedado em um camping/hotel chamado Los Abuelos. Recomendo-o a todos que pretendem visitar San Pedro. Fiquei hospedado em chalés (cabanas) feitas de adobe. Grosso modo, a impressão que tive desse tipo de arquitetura é como se as casas fossem feitas de barro por fora e bem estruturadas por dentro. A minha habitación era linda, rústica e cheia de energias. Achei esse hotel maravilhoso. Havia uma piscina de frente para a minha cabanã e o café da manhã era delicioso. Também havia quadra de esportes no hotel e uma parede de escaladas.

IMG_2862(2)Para aqueles que viajarão para a cidade, evitem sacar constantemente dinheiro nos caixas eletrônicos. Há poucos caixas pela cidade e como a quantidade de turistas é alta, as máquinas ficam descarregadas de notas. Tive problemas em relação a isso quando fui sacar dinheiro para pagar um dos passeios pelo deserto. Outra dica, não são todos os estabelecimentos que cobram  imposto quando o pagamento é efetuado em pesos chilenos. Esse hotel, por exemplo, não cobrou essa taxa.

ojossalar

Há muitos restaurantes pela cidade. Os nativos de San Pedro comem muito pollo e batatas assim como na Bolívia. Mas há opções para todos os gostos. Há algumas especiarias locais, vale a pena experimentar.

IMG_2882(2)

Assim que cheguei na cidade, fui direto para o hotel e liguei para a agência de turismo. Os preços das agências variam, mas não tanto. Parece haver uma espécie de cartel entre as agências de turismo. Gostei bastante da agência MAXIM EXPERIENCE. Geralmente, eles oferecem serviços de almoço e café da manhã nos passeios. Nesse dia, fui ao Valle de La luna pela manhã e na laguna Cejar, Ojos Cejar e laguna Tebinquinche pela tarde. Esse passeio é incrível. A laguna tebinquinche é um dos lugares mais lindos que já vi na terra. A lagoa é enorme, estende-se em tons de verde claro e perde-se no horizonte com montanhas e vulcões. A laguna cejar é um outro lugar imperdível, há tanto sal nesse local (afinal estou falando do deserto de sal do Atacama), que é possível boiar nessa lagoa sem o menor esforço. A minha dica para aqueles que farão esse passeio é: levem água para lavar o corpo e hidratante, pois o sal (muito sal) da água resseca e queima a pele. JAMAIS coloquem o rosto nas águas dessa laguna, especialmente a boca. Estou no meu quarto dia no deserto e mal consigo abrir a boca. Os meus lábios estão muito ressecados e rachados.

IMG_2865(2)

A guia (Odille) desse passeio era francesa e mudou-se para San Pedro para viver com o seu esposo chileno. Ambos são guias turísticos. Achei essa guia uma pessoa muito cheia de energia e animada, senti uma energia boa enquanto conversávamos. Ela me explicou muitas coisas sobre o deserto. Achei interessante quando ela me respondeu à pergunta sobre a região do deserto de Atacama ter sido um mar. Disse-me que sim, era uma mar. Mas a região não era coberta na superfície por água, há milhões de anos. Segundo ela, o mar dessa região era “subterrâneo”, estava abaixo de uma crosta formada por erupções vulcânicas. E todo o sal que forma esse deserto não é oriundo da água do mar que havia ali. Na verdade, segundo ela, há vários tipos de “sais” e nesse caso, o sal é produto, grosso modo, das erupções dos diversos vulcões ali presentes, assim os sedimentos das erupções se aglomeram e formam o salar.

A vegetação no deserto do Atacama é bastante variada. Não consigo conceber esse deserto como um conceito definido. Para mim há “vários” tipos de deserto ali. Há locais nessa região, inclusive, que jamais foram explorados. Há relatos de nativos que já viram OVINIS nesse região, enfim, o local é cheio de mistérios.

IMG_2864(2)

Sobre a terra de um dos maiores vulcões do local, descobri que há algumas minas. Um dos guias me disse que isso ocorreu devido à Guerra do Pacífico, há alguns séculos. A guerra ocorreu entre Bolívia e Chile. Essa região chilena faz fronteira com o país vizinho, onde localiza-se a laguna verde, laguna colorada e salar de Uyuni. Pensei que as minas no vulcão teriam sido colocadas por Pinochet, no período de ditadura rsrs. (Esse vulcão divide os dois países e está ao fundo da Laguna verde na Bolívia.) Mas não, as minas foram colocadas durante a guerra do Pacífico, que iniciou-se devido a conflitos entre investidores chilenos que precisavam de uma saída para o mar para exportar os minerais extraídos no Atacama. O conflito ocorreu devido a um importante local de exportação na época ser da Bolívia: ANTOFAGASTA e devido aos investidores em mineração pagarem impostos altos nesse porto, assim iniciou-se a guerra do pacífico. IMG_2852 IMG_2851Posteriormente a Bolívia pediu ajuda ao Peru,

a guerra se encerra com a vitória chilena que anexa a seu território Antofagasta e mais outras duas regiões que agora não me recordo.

Cheguei no hotel, nesse dia, por volta das 19 horas. Dei um mergulho na piscina e fui tomar banho para terminar de retirar o sal de minhas roupas e corpo. As minhas expectativas foram superadas nesse primeiro dia. Estava bastante ansioso para o segundo passeio.

Share on Facebook

Saindo de Santiago para San Pedro do Atacama

IMG_2777 (2)

À noite, acordei com a visão das estrelas, bem mais próximas de mim do que no Brasil. O céu estava lindo, límpido e bastante iluminado. A última cidade de que me lembro ter visto foi Antofagasta. Sei que a noite não é um bom referencial para fazer algum julgamento, mas achei a cidade muito bela. Pela manhã, passei por Calama (cidade do cobre) e percebi que havia algumas máquinas em alguns pontos do deserto. Um nativo, que me pediu água no ônibus, disse-me que o que vi era atividade de mineração. Ele também me disse que uma das maiores jazidas de cobre encontra-se em Calama. Apesar de ele estar um pouco bêbado, acredito eu, pelo cheiro de álcool e pela falta de nexo na conversa, ainda achei relevante parte de seus comentários. Ele não via a sua família há muitos anos, estava indo para Calama para reencontrá-los. Trabalhava como carpinteiro e, segundo ele, não havia “remédio” para ele mesmo. Despediu-se, depois de contar-me um pouco de seu sentimento de desaprovação por Pinochet e pelo governo chileno, seus gostos musicais e o significado de suas tatuagens.

IMG_2789 (2)

IMG_2822 (2)

IMG_2785 (2)

Fiquei inquieto no caminho para saber em quanto tempo chegaria em San Pedro de Atacama. Havia um visor no ônibus informando aos passageiros a respeito da velocidade média atingida. Inclusive, fui avisado, pela própria empresa que o ônibus não poderia ultrapassar, por lei, os 100 km por hora. O anúncio dizia que se os passageiros percebessem essa infração, deveriam chamar a atenção do motorista. Lembrei-me das continhas de física do primeiro ano do Ensino Médio: VM = delta S/ delta t rsrsrs (foi uma das poucas coisas que me lembro ter aprendido em física) e calculei em quanto tempo chegaria em San Pedro quanto avistei uma placa informando que de Calama para San Pedro eu ainda percorreria 102 km. Chegaria atrasado para fazer a minha primeira excursão pelo deserto: às 10 horas e alguns minutos. Pelo caminho, avistei várias hélices de usinas eólicas (e quase todas estavam paradas). Isso foi interessante porque me fez pensar nas teorias deterministas sobre o ambiente e questões econômicas. Enganam-se os que acreditam que não há nada no deserto. Quando comentei com alguns colegas que iria para um deserto, eles me olharam com dúvida… acredito que pensaram que não havia vida em um deserto ou beleza. Eles estão completamente enganados. O que tenho presenciado até agora foram muitas paisagens diversificadas, vários animais, tecnologia e cidades surpreendentes. Para ser poético e utilizando trecho de Grande Sertão: veredas, escrito por Guimarães Rosa: há um “grande sertão (deserto) dentro de todos nós”.  Faço referência ao sertão, pois é o que tenho mais próximo de desértico em meu país. Guimarães conseguiu fazer uma metáfora entre a universalidade humana e esses ambientes. Não é por acaso que esse livro pode ser compreendido em várias culturas, na Alemanha, por exemplo, porque a natureza do ser humano, assim como a complexidade de o que chamamos de “vazio” do deserto é imensurável. Adiciono a essa metáfora a dicotomia de nossas angústias: viver e morrer. Guimarães já dizia: “viver é muito perigoso”, porque “não sabemos”. Viver ou morrer, ser ou não ser, dia e a noite, a vida é cheia de dicotomias. Compreendê-las não faz sentido sem essa relação de oposição. Não tenho medo do mundo, tampouco de mim mesmo. Sei que viver é muito complexo e que poucas pessoas sabem lidar com isso. Essa relação de oposição valida os sentidos de quase todas as nossas questões existenciais. O que seria o Pantanal sem o deserto, o dia sem a noite ou ainda o ser humano sem a sua essência dicotômica? É o próprio conceito de pares mínimos de Saussure na linguística e também pode ser compreendido em uma perspectiva cultural por Levi Strauss na antropologia, o que na literatura é possível fazer poesia. Compreender um sistema linguístico, para muitos linguistas é possível, grosso modo, por uma relação de oposição de fonemas e morfemas. Por exemplo, em uma perspectiva sonora, que não irei simbolizar aqui, “pato” opõe-se a “gato”. Isso é interessante porque na língua, no caso do português do Brasil, ambos esses signos geram sentidos diversificados. O falante nativo e alguns estrangeiros rsrs conseguem diferenciar os diversos signos do sistema linguístico, por essa relação de oposição. É óbvio, no entanto, que isso não é um processo consciente. E ele ocorre em vários níveis, sonoros, morfológicos e semânticos. No caso de culturas, é possível compreender essa relação, por exemplo, pela própria organização de culturas/grupos que se opõem ou se excluem, o que é um aspecto interessante do conceito de identidade. Por exemplo, se eu me oponho a um grupo x é porque afirmo nessa oposição o que sou, a minha identidade. Isso deve ocorrer em nível individual e também social. Já na poesia, o que resta é o arranjo dessas palavras nesse tópico, que não precisa de rimas ou de uma estrutura de poema.

IMG_2790 (2)IMG_2828 (2)IMG_2792 (2)

Muitos não entendem porque viajo tanto e de onde vem a minha gana incessante por essas viagens. Viajar me ajuda a lidar comigo mesmo, a compreender melhor o mundo e a mim mesmo. Por meio das minhas viagens eu posso compreender os extremos de minha identidade, os polos que se opõem entre o que me forma regionalmente e o que sou de maneira universal. Isso me faz acreditar que não sou tão “pequeno” quanto a minha própria experiência, identidade e o ambiente de onde vim. Também me tranquiliza pensar que faço parte dessa imensidão, de algo maior do que eu mesmo.

K4

Share on Facebook