A medida dos textos
Há mais de dez anos revisando textos — de instituições de todo o país e de diversas áreas do conhecimento —, observo certo padrão em relação à extensão destes: uma média entre 100 a 120 páginas* no máximo (utilizo, neste texto, o termo “página” popularmente, considerando o formato A4 do Word, fonte Times New Roman, espaçamento de 1,5 entre as linhas).
*O termo “página” não corresponde à “lauda”, termo utilizado no mercado de Revisão. 1 lauda varia entre 1000 a 2000 caracteres com espaços. “Página” é um conceito impreciso e esvaziado de sentido.
Além disso, nos últimos três anos, tenho notado, curiosamente, o fenômeno de hibridização de gêneros, que tem levado a uma redução ainda maior da extensão desses textos — um movimento articulado ao projeto contemporâneo das tecnologias digitais (alô algoritmo), que buscam reduzir o ato de pensar.
Mesmo em Humanas, com mais espaço para argumentação, não é comum encontrar textos que ultrapassem meio milhão de caracteres com espaços (o que corresponde, popularmente, a cerca de 200 e “alguma coisa” páginas). Ás vezes — é raro, mas acontece — recebo textos com mais de um milhão de caracteres com espaços (especialmente em áreas como Direito).
Vale uma comparação simples: meio milhão de caracteres equivale, praticamente, a três dissertações reunidas em um único texto. E, naturalmente, isso exige do autor consciência. Ás vezes o texto está longo mesmo por excessos desnecessários, períodos mal elaborados, trechos repetidos, excesso de subjetividade. Ás vezes isso ocorre, especialmente em áreas de humanas, devido à complexidade do recorte temático…
Algumas instituições, especialmente particulares, alegam, em relação a essa tendência de encurtamento de textos acadêmicos, concisão, eficiência ou atualização de normas. Algumas, inclusive, impõem limites e definições de número de páginas e querem controlar, rigidamente, o texto do pesquisador. Confesso que não concordo com essa tendência. Não se trata apenas de um limite material; trata-se de uma limitação simbólica. Assim,
Menos é sempre mais? A resistência ao pensar
Limitar o tamanho de um texto é, em alguma medida, limitar o gesto de pensar. E um ambiente que se incomoda com textos longos não está propriamente preocupado com o rigor; está preocupado com o esforço de ler — e com aquilo que a leitura provoca. Essa resistência à leitura, travestida de modernização, revela uma resistência mais profunda: resistência ao encontro com a complexidade. Em primeiro lugar,
É claro que teses e dissertações, em geral, já são textos fora do padrão, desconfortáveis para quem busca leveza, impraticáveis para quem se acostumou ao ritmo fragmentado das redes sociais. Exigem tempo; quando ultrapassam meio milhão ou um milhão de caracteres, podem revelar outra escala de pensamento/complexidade.
E, nesse sentido, retorno ao ponto central: menos é sempre mais, sim, mas somente quando esse “menos” constitui uma escolha consciente do autor — e não quando é imposto de fora para dentro. A concisão é um gesto intelectual, não uma norma. Um texto pode ser breve e profundo; pode ser extenso e preciso; pode ser longo e, ainda assim, extremamente lúcido (e mais fácil de “digerir” e “apreciar” do que textos ditos curtos). O que importa não é a metragem, mas a consciência. Primeiramente,
A minha função, nesses casos, como Revisor, não é reduzir o texto a uma versão “aceitável” — embora já tenham me pedido para fazer isso, e eu posso até retirar partes desnecessárias do texto, sim, e reduzi-lo, se for o caso —, mas auxiliar o autor a descobrir a melhor forma possível para aquilo que ele se propôs a construir. Assim,
Talvez este seja, portanto, o ponto mais importante: textos longos não deveriam causar espanto na academia — afinal, pensar exige espaço. Mas esses textos pedem atenção. Não pela extensão, mas pelo gesto. Um texto de um milhão de caracteres, às vezes, não é, problematicamente, um texto “extenso” que precisa ser reduzido a qualquer custo, mas um projeto afrontoso e atrevido — o que, atualmente, é raro — que merece o devido reconhecimento. Assim,