Sinais de revisão estão ultrapassados?

Sinais de revisão estão ultrapassados?

Sinais de revisão não são usados por todos os revisores, nem necessariamente devem ser usados. Não vejo razão alguma para o uso desses símbolos durante o processo de revisão, para ser bem sincero. Eles não tornam a revisão melhor ou pior.

Para o cliente, então, esse uso é IRRELEVANTE, dominá-lo pode ser interessante para o Revisor que pretende trabalhar em uma editora ou em uma seção de Revisão de Textos, isso permite uniformizar a linguagem de revisão em um AMBIENTE DE TRABALHO com mais de um revisor, mas se LIMITA ao ranço do processo em si, oriundo da área de jornalismo, a respeito de editoração.

Com as tecnologias digitais, no entanto, bem como em relação aos avanços científicos na área de sociolinguística, linguística textual, podemos trazer reflexões científicas e mais significativas para pensar esse processo.

Em relação ao cliente, este não tem interesse em saber sinais de Revisão, tampouco é papel do Revisor ensiná-lo ou exigir que este tenha conhecimento desses símbolos, muito menos ter conhecimento de nomenclaturas gramaticais. Revisores, às vezes, querem agir como “messias” e, infelizmente, é importante deixar isto bem claro: REVISORES NÃO SÃO SALVADORES DE NINGUÉM! NUNCA FORAM E NUNCA SERÃO. Portanto, assim…

Revisor algum deve querer impor isso a um cliente. Essa atitude é, no mínimo, um exagero. Estava lendo um texto de um revisor que afirma, necessariamente, a necessidade do domínio dessa simbologia para a atuação em Revisão de Textos. Discordo completamente.

Esse tipo de requisito é argumento para quem não tem formação em linguística, a ciência que estuda a língua, e traz o ranço do ofício do jornalista para o universo de Revisão.

E, lamento informar, mas algumas teorias arcaicas na área de comunicação, ainda utilizadas no discurso de revisores desatualizados, bem como a supremacia da profissão ao ranço do jornalismo vigoravam no século passado; neste, as coisas mudaram bastante, principalmente com os avanços da linguística, especialmente na área de linguística textual, bem como em relação ao uso das tecnologias digitais, que são extremamente importantes para o universo de Revisão de Textos.

Primeiramente, como digo, sempre, em meus posts, a língua é objeto de estudo da linguística, não é objeto da área de comunicação social. Inclusive,  sugiro este post para reflexão sobre o que quero dizer em relação à decadência do jornalismo hoje. 

Ocorre que o profissional do jornalismo tem mais prestígio social e, por essa razão, se coloca (e é colocado) em um lugar indevido e por uma questão histórica de profissional da área. Desculpem a crítica, mas, em própria Teoria de Comunicação, muitos profissionais dessa área sequer sabem que os termos emissor e receptor são infundados e estão em desuso.

Na verdade, é complicado falar em comunicação, devemos falar em interações e aqueles que participam desse processo não estão em uma posição “passiva” ou “ativa”, tampouco devem se colocar dessa maneira. Esse pensamento, que, inclusive, chegou à sala de aula, e ainda é manutencionado, carece de crítica, de conhecimento científico.

É mais importante que o revisor tenha domínio de outras questões, de fato, relevantes para o trabalho dele, que tenha conhecimento de outras línguas, vivências, que tenha, minimamente, curso de mestrado, que tenha estudado antropologia, psicologia, filosofia e que saiba o que é crítica, bem como usá-la.

Dominar nomenclatura de símbolos em Revisão de Texto é uma atividade mecânica, que se resume, grosso modo, a “dar nomes aos bois” (faço a mesma crítica, em relação à educação, aos métodos falhos de ensino que insistem, na área de Língua Portuguesa, no ensino mecânico e decoreba de nomenclatura gramatical: “oração subordinada substantiva: bla, bla, bla…”).

As pessoas precisam pensar e não decorar nomenclaturas de símbolos. Bom Revisor precisa ter delicadeza, sensibilidade literária, senso investigativo aguçado, precisa ser um crítico das palavras, um analista críticos de discurso, precisa de sensibilidade artística para compreender o discurso não verbal, um linguista e não um reprodutor de nomenclaturas gramaticais ou de simbologias utilizadas em editoração.

Não gosto dessa discussão sobre “linguagem universal”. Há aqueles que argumentam que os sinais de revisão podem ser uma “linguagem universal” para o universo da revisão. Isso é uma piada?

O ser humano é bastante complexo, é muito limitador falar em uma linguagem universal. Essas propostas são inatingíveis para o plano humano. E quem acredita nelas tem o pensamento, no mínimo, limitado.

Quando estagiei, durante 1 ano, no Supremo Tribunal Federal, na Seção de Revisão e Padronização de Textos, eu tive de memorizar esses símbolos e utilizá-los em meu trabalho. Eles eram importante para uniformizar e formalizar, vamos dizer dessa maneira, as intervenções dos revisores nos textos revisados.

Não acredito, por exemplo, no entanto, que essas simbologias sejam mais eficientes do que o uso, por exemplo, do recurso Revisão de Texto do Word ou de outros softwares/ferramentas. Se você entregar um texto revisado com essas simbologias de revisão ultrapassadas a um cliente, ele, no mínimo, ficará frustrado e terá de perder bastante tempo para compreender as marcações.

Conturbada relação entre autor e Revisor de Texto

Compartilho com vocês este texto, muito esclarecedor, sobre a relação entre autor e Revisor de Texto, autoria de Matheus Tussi, disponível no site biblio.info.


Vamos falar sobre a intervenção em texto alheio, sobre aquele profissional que tem a audácia de “mexer no meu texto”: o revisor. Figura ainda existente em redações de jornais e escritórios de editoras, mas cada vez mais um profissional autônomo que presta serviço do seu home Office. O revisor de texto, chamemos assim o responsável pelos serviços de preparação de originais, copidesque, revisão gramatical, revisão de tradução etc., tem uma complicada relação com o autor do texto – melhor, o autor é que tem uma relação difícil com o revisor, visto que, no mais das vezes por desconhecimento ou por falta de bom senso das partes, é o autor quem desaba a destratar o profissional aqui e ali.

Isso me lembra um tuíte ainda do início de 2015 que é um exemplo disso. A escritora Clara Averbuck publicou em sua conta do Twitter, em 19.01.15, o seguinte: “meu trauma com revisores cresce a cada texto que me foge das mãos. metem aspas onde não tem, itálico onde não deve, mas que saco”.

O desabafo de Clara gerou muitos apoios: “revisor tem a mania de achar que sabe o que a gente quer dizer” (@tatimrqs); “alguns revisores se apegam mto rigidamente às regras. daí vão revisar literatura dá nisso. a editora precisa saber selecionar” (@__perola_); “revisor deveria ter como primeira regra: jamais modificar sentido de frases que não são suas” (@gaidarjic); “revisor não é dono do texto” (@tomfernandes).

O escritor Cristovão Tezza, no texto “A vingança dos revizores”, publicado na Gazeta do Povo em 2013, já inicia declarando que vem mantendo, ao longo da vida, “uma relação de amor e ódio pelos revisores de texto”.

Mas será mesmo que essa relação tem que ser assim? E por que será?

Tratemos aqui da produção de um livro em uma relação editorial ótima, quando temos um editor atuante, que é conhecedor dos trabalhos textuais e que faz o meio de campo entre autor e profissional do texto. Deixo de lado, neste momento, a autopublicação ou quando o autor trata diretamente com o revisor, seja porque a editora assim possibilita ou porque se trata de um texto a ser publicado em outra plataforma que não a editorial.

Bom, no processo editorial de um livro já na língua em que será publicado, de um modo geral (sabemos que cada editora tem o seu método) o texto vindo do autor cairá nas mãos do editor ou de um assistente editorial. Este fará suas considerações, seus ajustes e remeterá a um profissional para a preparação de texto. Depois da preparação, o texto volta ao editor, que confere e aprova o trabalho, remetendo o texto ao diagramador. Ao final, a publicação passa pela revisão final. Esse processo terá idas e vindas, tantas vezes quanto o editor considerar necessário para a publicação.

Quero destacar os seguintes aspectos do trabalho com texto alheio que considero fulcrais para uma boa publicação:

1) Limites: Em uma preparação de texto, o profissional tem que saber o que fazer no texto. é necessário que fique claro o que a editora espera do trabalho, pois não há um método que funcione sempre. Cada obra merece uma atenção diferente. É ficção ou não ficção? De que área do conhecimento? Os membros dessa área são mais apegados à formalidade (como o direito) ou não (como a comunicação)? No texto, especificamente, as ideias estão confusas? Até que ponto o autor está aberto a intervenções? Esses aspectos devem estar bem acordados com o revisor. Cada obra, portanto, merece uma atenção especial. Não basta, então, o costumeiro “revisa esse livro”, como se o trabalho fosse objetivo e não houvesse questões específicas da obra a serem discutidas;

2) Padrões editoriais: é a editora quem define os casos que merecem itálico e os que merecem aspas. Qualquer palavra estrangeira ficará em itálico, apenas as menos conhecidas ou nenhuma? Haverá restrição ao uso de maiúsculas? A editora terá esses padrões, seja para todas as suas publicações, para aquela série ou mesmo para a obra em específico. Ela poderá buscá-los em algum manual existente ou ter o seu próprio. Portanto, o revisor não sairá adotando padrões sem que haja critérios preestabelecidos;

3) Preferências do autor: ainda assim, o autor terá suas preferências, que serão ou não aceitas na publicação. “Odeio itálicos”, diz o autor, então a editora definirá se realmente não usará itálico em nenhum caso. “Quero escrever País e Estado”, e se decidirá se isso é adequado ou não naquela obra. Essas definições serão passadas ao profissional do texto.

É fato que a relação que a editora mantém com o autor também incide nisso tudo: autores best-sellers ou que já dão uma boa resposta à editora em termos de vendas terão voz mais ativa, assim como aqueles que de alguma forma estão contribuindo no orçamento da publicação; já autores novos talvez tenham que se adaptar um pouco mais ao que for definido nessas questões. Então não vale o clássico: “o Saramago também faz isso”…

Algo que devemos considerar, fundamental em qualquer discussão nesse tema, é que língua é uso, e não imposição de regras. Afora a ortografia, regulada por lei (e ainda sim passível de boas discussões entre dicionaristas, gramáticos e a própria ABL), tudo o mais é opção, bom senso, adequação. E nisso, claro, haverá divergência. Um trabalho de intervenção, portanto, é sempre subjetivo: há muito mais adequação linguística conforme o gênero textual e o veículo pelo qual o texto é transmitido do que uma mera aplicação de “regras de português”, resultando em um grande campo de discricionariedade para o redator.

No mesmo texto de Tezza referido acima, o escritor diz:

Mas a língua é bicho indócil, seja falada ou seja escrita, e o espectro de possibilidades é infinito. Começa da certeza absoluta – a ortografia, como grafar as palavras, uma área definida por lei – até uma grande zona mais cinzenta e esotérica, capaz de provocar discussões metafísicas, no bar e na escola, o que inclui colocação de pronomes (“ele me tinha dito” x “ele tinha me dito”), aspectos de concordância (“ouviu-se as vozes da rua” x “ouviram-se as vozes da rua”) e o gigantesco banhado da regência (“vou no cinema” x “vou ao cinema”. Ou, nesse mesmo texto, lá em cima, “lembro o horror” ou “lembro do horror”? E, falar nisso, “nesse texto” ou “neste”?).

O texto é do autor, claro, sendo este o responsável final pelas escolhas de linguagem. Havendo divergência entre as mudanças/sugestões do revisor e as opções do autor, cabe a decisão à casa editorial, representada pelo editor, não devendo o revisor ser responsabilizado, pois um bom trabalho editorial supõe que cada um faça a sua parte – e não é parte do revisor tomar essas decisões, mas sim marcar as alterações que considera importantes, sugerir mudanças, informar usos.

Se houver algo que o revisor considere muito grave, e que será mantido por decisão editorial, então o profissional pode solicitar que seu nome não conste nos créditos, para não parecer que tais “gravidades” tiveram a sua chancela. O revisor é, portanto, um cúmplice do autor, e não seu algoz. Afinal, um bom produto final, com texto fluente e livre de imprecisões e problemas, é o objetivo de todos, ainda que o mérito acabe sendo sempre do autor, às vezes da editora e nunca, ah, nunca do revisor.

http://biblioo.info/o-autor-e-o-revisor/